Uma das coisas mais essenciais para que uma pessoa possa ser cuidada, ajudada em sua vida através de um pastoreamento efetivo, é que ela seja submissa.
Pois não se pode ajudar um soberbo, alguém que não tem um espírito tenro.
Quando Davi escreveu o Salmo 23 ele pensava em seu relacionamento com Deus, o Senhor, tendo por base o seu cuidado com suas ovelhas.
Em primeiro lugar ele afirma que Deus é Senhor. Isso significa que o Deus Eterno tem toda a autoridade e é dono de tudo o que existe. A palavra Senhor expressa não somente uma forma de tratar alguém, mas fala de alguém que é proprietário e soberano sobre algo.
Essa é a primeira constatação: Deus é o Senhor.
A segunda constatação é que esse Senhor é pastor, não somente tem autoridade e soberania, mas tem um caráter amoroso, um caráter de pai que cuida e supre.
O restante do salmo mostra a visão de pastoreamento que Davi tinha.
Segunda constatação: Deus é Pastor.
A terceira consideração que Davi faz é que ele é uma ovelha que precisa de cuidados e se deixa cuidar. Não é um cabrito que tem vida livre e solta, tem autonomia para estar onde quer. Esse é o caráter do cabrito, nunca está onde o dono pensa que está, por isso precisa de um sininho no pescoço para que o dono o localize.
A quarta constatação ele é uma ovelha.
A próxima percepção de Davi é que, sendo ele uma ovelha precisa de pastor e o seu pastor é o Senhor.
A conseqüência de ele ser uma ovelha que está submissa ao Pastor, que é o Senhor Deus, é que nada lhe faltará.
Infelizmente o que mais nos chama a atenção nesse salmo é o fato de que nada nos falta, então partimos para um tipo de demanda em Deus para que nada nos falte. Esquecemo-nos do tremendo fato de que o Senhor supre as necessidades de SUAS OVELHAS.
O Senhor tem compromisso em suprir nossas necessidades e não nossas vaidades.
Como pai e pastor que é ele cuida de nós naquilo que precisamos para viver.
Os versículos seguintes do Salmo 23 mostram uma ovelha que se deixa guiar, que aprendeu a se entregar às mãos do Pastor. Mesmo em situações de aflição ela se permite ser levada pela mão do pastor. É por causa dessa atitude que nada lhe falta, e que suas necessidades são supridas.
A submissão é uma atitude de coração, manifesta através da obediência. A submissão é a atitude interior provocada pelo quebrantamento. Não depende de situações externas. É parte do caráter de alguém.
Ela é diferente da obediência na essência, pois uma é absoluta e a outra relativa.
A submissão é, por assim dizer, construída na vida do cristão e se torna integrante no seu ser. A pessoa é submissa não importa a quem. Isso, em termos práticos significa que eu obedeço à sinalização mesmo na ausência de um guarda de trânsito. Não depende da presença de uma autoridade para que manifeste obediência.
Quando eu escolho a quem eu quero submeter isso revela minha insubmissão. No episódio onde Paulo chama um sacerdote de parede branqueada (At 23:1) há uma mostra do entendimento que ele tinha de submissão. Ele não devia se insurgir contra um príncipe. É uma questão de conceito, de compreensão anterior ao fato.
O seu entendimento de respeito à autoridade é anterior ao acontecimento.
O que quero mostrar é que uma pessoa tem esse caráter submisso antes de ser colocado diante de uma situação onde precisa mostrar obediência.
Por isso afirmo que a submissão é absoluta. Assim como a pureza é absoluta, a honestidade é absoluta, a integridade é absoluta, a submissão também é. Estamos falando de caráter.
Existe uma situação hipotética que ajuda a ilustrar: se um assaltante chegar para mim e, com um revólver em sua mão, me ordenar que levante minhas mãos, vou obedecer pela força do argumento (o revólver). Isso, de forma nenhuma, mostra que eu sou submisso ao ladrão.
Fui obediente sem ser submisso.
Há uma história de uma mãe que falou a uma menina que se assentasse. Depois de muito insistir ela toma o chinelo e nesse momento a menina se assenta. Ao se assentar a mãe escuta a filha dizer: “ por fora eu me assentei, mas por dentro estou de pé”.
Creio que essas ilustrações ensinam a diferença entre ser submisso e obedecer.
O submisso normalmente obedece, o que obedece nem sempre é submisso.
A obediência é relativa, pois existem situações nas quais a autoridade maior está sendo desrespeitada por uma ordem que vem de um escalão inferior.
Por exemplo, quando os discípulos recebem uma ordem de não mais proclamar o nome de Jesus, eles não obedecem. Claro que sofrem as conseqüências dessa desobediência.
Quando Sedraque, Mesaque e Abdenego recebem uma ordem do rei de se dobrarem diante de uma estátua não obedecem.
Nos dois casos havia ordens superiores às ordens daquelas autoridades naturais.
Quando uma autoridade nos propõe pecar, infringir as leis do Senhor, temos a responsabilidade diante de Deus de fazer a escolha entre obedecer ou não.
O parâmetro aqui é a vontade de Deus, suas leis.
Não posso, em hipótese nenhuma, me esconder atrás de qualquer artifício para desobedecer. Se eu fizer isso estou demonstrando minha insubmissão.
A submissão é a qualquer irmão e a todo irmão: “sujeitai-vos uns aos outros, em amor” (Ef 5:21).
A obediência é a quem tem autoridade.
Existe um outro lado dessa questão.
É interessante notar que Jesus não cobrava de seus discípulos uma obediência. Aliás, eu não encontrei nos evangelhos a palavra obedecer ou qualquer uma derivação.
Também a própria palavra submissão ou seus derivativos somente aparece quando os discípulos falam dos demônios.
É, portanto, sintomática a ausência desse vocábulo nos ensinos de Jesus. O que ele quer nos ensinar com respeito a isso? Há algum ensino da parte de Jesus com relação à obediência e à submissão?
Há e de maneira muito forte.
O ponto aqui é que Jesus ensinava a submissão sendo submisso. Ensinava a obediência, obedecendo.
O seu ensino sobre isso era indireto. Ele mostrou sua completa submissão ao Pai e disse que foi dessa mesma forma que ele nos enviou.
Gostamos da figura do leão relacionada com a pessoa de Jesus. Mas, um dado estatístico é que em Apocalipse a palavra leão relacionada com Jesus aparece duas vezes e a palavra cordeiro (com relação a Jesus) aparecem 28 vezes!
Talvez, o quadro mais lindo e tocante de Apocalipse é a figura, não de um leão, mas de um cordeiro assentado no trono.
Isso fala da forma como Jesus chegou ao trono e fala também de seu caráter.
Paulo nos fala com muita propriedade sobre isso na carta aos Filipenses 2:5-11:
De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus.Mas aniquilou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte e morte de cruz. Pelo que também Deus o exaltou soberanamente e lhe deu um nome que é sobre todo o nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai.
Foi dessa forma que Jesus ensinou.
Quando o centurião lhe pede que vá em sua casa revela a compreensão que tinha sobre a fonte de autoridade de Jesus
“pois também eu sou homem sujeito à autoridade, tenho soldados às minhas ordens e digo a este: vai, e ele vai; e a outro: vem, e ele vem; e ao meu servo: faze isto, e ele o faz”. (Mateus 8:9)
Aqui está o segredo de Jesus: um homem sujeito a autoridade.
O discipulado tem sido confundido com muitas coisas: com cursos, com métodos, com esquemas, com militarismo e tantas outras coisas mais.
Mas, quando olhamos para Jesus e seu relacionamento com os homens que o seguiram o que encontramos é uma atitude de quem serve.
Ele falou isso, que o maior seja o que serve. Também disse que não veio para ser servido, mas para servir.
Ele lavou os pés dos discípulos e nos orientou fazer o mesmo.
Onde estão as posições de autoridade que muitas vezes queremos?
Podemos dizer que pelo fato de sermos pais na igreja, temos o direito de sermos obedecidos.
Precisamos compreender algumas coisas:
na igreja não temos direitos (foram cravados na cruz). O único e irrevogável direito que temos é o de servirmos aos nossos irmãos.
na igreja os pais ocupam uma posição de servos mais velhos pois, numa casa, quem é o que mais serve?
os que ocupam um papel de autoridade o fazem para o bem estar da família/igreja. O fim da autoridade é a vida de seus discípulos. (Jo 17:2 assim como lhe deste poder sobre toda carne, para que dê a vida eterna a todos quantos lhe deste).
Penso que a meta do discipulado não é ensinar alguém a obedecer. Penso que a meta do discipulado é apresentar a pessoa ao Senhor Jesus. Acho até que o trabalho do discipulador não é o de formar o caráter de Cristo no discípulo, mas expor esse discípulo a uma operação do Espírito Santo para que esse faça essa obra.
Precisamos fazer como fez João, o batista.
Ele estava com dois de seus discípulos. Ao ver Jesus ele lhes disse: “eis o cordeiro de Deus...” Os seus discípulos ouvindo isso, seguiram a Jesus.
O nosso trabalho é guiar os discípulos até o Senhor. Erramos quando trazemos os discípulos para nós e nos tornamos no foco de atenção, o ponto de atração. O nosso papel é o do amigo do noivo: devemos preparar as pessoas para o Senhor Jesus.
A obediência e a submissão estão integralmente ligadas a isso.
Na medida em que andamos e agimos dessa forma o Senhor fará com que os discípulos dele que andam conosco, nos obedeçam e se sujeitem a nós, no Senhor. Quando temos revelação da pessoa de Jesus, conduzimos as pessoas para essa mesma revelação. Foi o caso de Felipe e Natanael.
Não podemos compreender a questão e a natureza da obediência e da submissão fora do parâmetro maior da nossa própria e integral submissão ao Senhor dos senhores, ao Rei dos Reis, ao Cordeiro no Trono.
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